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Frontispício da primitiva Igreja de São José (in Album Michaelense, de Joaquim Cândido de Abranches, em 1869)

Frontispício da Igreja de São Francisco (in Album Michaelense, de Joaquim Cândido de Abranches, em 1869)

DE TEMPLO FRANCISCANO A PAROQUIAL DE SÃO JOSÉ:

BREVE HISTÓRIA DA IGREJA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO

As terras onde hoje se encontra a igreja paroquial de São José eram, no século XVI, propriedade de Fernão de Quental e de sua mulher, Margarida de Matos, sendo esta quem ali mandou erguer uma ermida de invocação a Nossa Senhora da Conceição, em data que se desconhece. O templo apenas terá sido terminado após sua morte, pelos seus filhos Afonso de Matos de Quental e Jerónimo de Quental, decorria então o ano de 1544. Nessa altura, já ali estavam instalados os frades menores de São Francisco de Assis, vindos de Vila Franca do Campo para Ponta Delgada por volta de 1525, três anos após o sismo que destruiu aquela vila micaelense. Quando estes frades franciscanos manifestaram o interesse em se instalar em Ponta Delgada, pretensão bem acolhida pela governação local, foi-lhes indicado três locais possíveis para a instalação do cenóbio: a nascente, perto da Calheta de Pero de Teive, onde hoje se localiza a Cadeia da Boa Nova; a norte, num campo onde mais tarde os capitães do Donatário e futuros condes de Vila Franca levantariam o seu paço, sensivelmente onde agora está a Escola Secundária Antero de Quental; e, finalmente, a poente, junto à ermida de Nossa Senhora da Conceição, erguida por Margarida de Matos, o local escolhido. Assim, em julho de 1525, Frei Brás, comissário da Ordem de São Francisco de Assis nas ilhas dos Açores, solicitou aquela ermida à Câmara Municipal de Ponta Delgada para ali ser edificado o desejado convento, no que foi prontamente atendido pelo senado camarário. Um documento municipal datado do mesmo mês testemunha a dação, dizendo que da dita “ermida e adro e cerrado lhe logo deram a posse e houveram por apossado para fazimento do dito mosteiro da Ordem de São Francisco”1. Sobre essa ermida, os franciscanos viriam a proceder à construção de um novo templo que conservou a primitiva evocação. Iniciado muito possivelmente ainda no século XVI, dele pouco se sabe hoje, apenas Frei Agostinho de Monte Alverne, nas Crónicas da Província de São João Evangelistas das Ilhas dos Açores, nos dá notícia, dizendo que para além do altar-mor tinha mais “sete altares, um dos quais dedicados aos Santos Cosmes”2. O crescente número de irmãos, e da comunidade a que estes assistiam, levou a que passado pouco mais de um século, mais concretamente em 1709, os franciscanos dessem início à construção de uma nova e maior igreja que, passados seis anos, a 25 de junho de 1714, receberia o Santíssimo Sacramento, conforme consta na inscrição lapidar que sobrepuja a porta principal do templo. Os acabamentos, nomeadamente a decoração, ainda se prolongariam por muito mais tempo, sendo a igreja apenas sagrada a 4 de julho de 17893. O novo retábulo do altar-mor, concebido em estilo barroco nacional, receberia uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, em nicho central, ladeada por São Francisco de Assis e São Domingos de Gusmão, numa solução adotada em inúmeras outras igrejas franciscanas. A extinção das ordens religiosas em Portugal, na sequência de guerra civil de 1832-1834 e da implantação do regime liberal, veio alterar a vivência dos Frades Menores de São Francisco nesse espaço que, após a sua expulsão, foi entregue à paróquia de São José atendendo a que sua igreja ameaçava ruína. A paróquia de São José teve origem no lugar de Santa Clara, solitário arrabalde da Ponta Delgada quinhentista, em cuja ermida foi estabelecida a sede da paróquia – a terceira da então nascente cidade4, depois das de São Sebastião e São Pedro – por D. Gaspar de Faria, Bispo de Angra (1571- 1576), logo nos primeiros anos da sua prelatura. A nova paróquia seria acrescentada em superfície “fregueses”, alguns anos depois, quando em 1581 o Bispo seguinte, D. Pedro de Castilho, que governou a diocese até 1586, lhe alterou o limite nascente para junto da rua da Cruz e sua continuação para norte, estabelecendo nova confrontação com a vizinha matriz de São Sebastião. Aos cerca de 300 “fregueses” que Santa Clara teria por essa altura, segundo informação de Gaspar Frutuoso nas Saudade da Terra, vieram então juntar-se mais 766 “almas de confissão”, dessas novas áreas. Na mesma provisão que estabelece o aumento da área da paróquia, o referido bispo considera a pequena ermida de Santa Clara exígua e distante, face às necessidades dos seus mais recentes paroquianos, ordenando a construção de um templo maior e mais próximo destes5. O bispo D. Pedro de Castilho decretou um prazo de quatro anos para edificação da nova igreja, mas como se sabe a ordem e o prazo não foram cumpridos e a sede paroquial rondou ainda pela igreja do convento franciscano de Ponta Delgada e pelas ermidas do Corpo Santo, das Chagas e de São Mateus para, apenas em 1714, se fixar num templo dedicado a São José, erguido então onde hoje é o Jardim Sena Freitas. Seria esta igreja, construída mais próxima do centro urbano de Ponta Delgada, que iria mudar o nome à paróquia, que de Santa Clara passou gradualmente a São José6. Passados apenas cem anos, talvez pela má qualidade da construção ou por ação dos elementos naturais, esta igreja de São José já ameaçava ruína, facto que levou a solicitar-se junto ao Prefeito José António Ferreira de Moura, responsável pela Província Oriental dos Açores, a mudança da paróquia – então já conhecida por aquela evocação – para a igreja do antigo convento dos franciscanos, entretanto vacante no seguimento da extinção das ordens religiosas em Portugal, ocorrida em 1834. Assim, a 14 de setembro desse mesmo ano7, a sede da paróquia de São José foi transladada definitivamente para a igreja de Nossa Senhora da Conceição8. Cinco anos depois, uma Carta Régia9, assinada pela Rainha D. Maria II e datada de 30 de julho de 1839, ao conceder o espaço do antigo convento e sua cerca à Misericórdia de Ponta Delgada, também definia as áreas do antigo cenóbio agora na posse da paróquia de São José: “a Igreja e suas pertenças, que comprehendem tambem o corredor de pedra e sua galeria ao sul da dita Igreja, o quarto da livraria sobre a Sacristia, e duas pequenas porções de terreno, cercadas de muro, contiguas á mesma Sacristia”. Também o recheio artístico da igreja franciscana ficou na posse da paróquia, constando do Inventário dos vasos sagrados, paramentos e mais objectos existentes na Igreja dos extintos egressos franciscanos, desta dita cidade, hoje pertencendo à paroquial de São José da mesma cidade, feito no dito dia 5 de Outubro de 1837 e guardado no Arquivo Paroquial. A paróquia de São José mantém, desde então, a sua sede na antiga igreja conventual de Nossa Senhora da Conceição, que apesar de continuar sob a evocação da Virgem Maria, é hoje popularmente conhecida como “Igreja de São José”, mostrando o apreço em que é tido o santo patrono da paróquia, pai terrestre de Jesus Cristo e Protetor da Igreja Católica.

 

Ana Maria Fernandes

Pedro Pascoal F. de Melo

 

1 Vd. Arquivo dos Açores, vol. XIV, pp. 220-221.

2 Estes eram São Cosme e São Damião, cujo retábulo ainda permanece à entrada da igreja, à esquerda, do lado do Evangelho, dos quais

houve relíquias trazidas de Roma por um tal Diogo ou Jácome Raposo.

3 Conforme consta em lápide colocada na galilé da igreja. Neste ato seriam utilizadas as referidas relíquias de São Cosme e São

Damião, que foram encerradas em caixa algures debaixo da capela-mor.

4 Vd. Arquivo dos Açores, vol. I, pp. 323-324.

5 Vid. Arquivo Paroquial da Igreja de São José, Livro de capítulos de visitas (1581-1798), fl. 4v.

6 Facto que se poderá explicar pela sua importância em número paroquianos, largamente superior aos que continuavam a frequentar a pequena ermida do antigo lugar de Santa Clara.

7 Vd. Escavações de Francisco Maria Supico, Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1995, p. 657.

8 A arruinada sede paroquial, da evocação de São José, seria demolida alguns anos mais tarde, após ter tido usos diversos, para no local ser construído o primeiro Teatro Micaelense, no ano de 1861.

9 Publicada no Diário do Governo, n.º 186, de 7 de agosto de 1839.

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